Sem-abrigo em Fran& a. Dos vagabundos da Idade M& dia aos & sem residência fixa& atuai

Facebook Twitter LinkedIN WhatsApp Messenger Email Dos mendigos e vagabundos aos 'sem domicílio fixo', a pobreza nas ruas francesas j& teve muitos nomes. Mas o problema persiste. Sem solu& ões na habita& & o, h& hoje mais de 200 mil sem-abrigo no país.
“Ser sem-abrigo & a forma mais extrema de exclus& o social e est& a crescer na Uni& o Europeia. Temos de agir j& .” O alerta foi feito em setembro deste ano por Nicholas Schmidt, Comiss& rio Europeu para os Direitos Sociais e Emprego, no âmbito do mais recente relatório da Federa& & o Europeia de Organiza& ões Nacionais que trabalham com os sem-abrigo (FEANTSA, na sigla em ingl& s).
O relatório estima que quase um milh& o de pessoas esteja a viver na rua, denunciando o agravamento das condi& ões de vida e o “falhan& o” das políticas de habita& & o e de imigra& & o na UE. O n& mero de sem-abrigo continua a aumentar na maioria dos Estados-membros, mas & em Fran& a que esta realidade mais atinge a popula& & o, onde h& cerca de 209 mil sem abrigo (o equivalente a 0,309% da popula& & o francesa).
A situa& & o agravou-se, sobretudo, após a pandemia de covid-19 que arrastou milhares de pessoas para a pobreza. Mas a crise na habita& & o, a imigra& & o sem regras e o aumento do custo de vida nos & ltimos quatro anos tiveram um impacto particular na popula& & o migrante e nos jovens.
No início deste ano, teve lugar mais uma edi& & o da Noite da Solidariedade, uma iniciativa da Câmara Municipal de Paris a fim de contar os sem-abrigo na capital francesa. Os cerca de dois mil volunt& rios que percorreram os parques de estacionamento, esta& ões de metro e jardins da capital francesa identificaram, em menos de tr& s horas, 3633 sem-abrigo, dos quais 3015 nas ruas do centro da cidade e 618 na grande metrópole parisiense, muito mais do que no ano passado, quando foram identificadas 2598 pessoas nesta condi& & o.
O problema em Paris ganha agora novos contornos enquanto a cidade se prepara para receber os Jogos Olímpicos, no ver& o de 2024. Tendas, cobertores e caixas de cart& o, que servem de casa a quem n& o tem morada, est& o a ser varridas das ruas da cidade.
À semelhan& a do que aconteceu por c& em julho deste ano, – quando a Câmara Municipal de Lisboa realizou uma “opera& & o de limpeza” junto de tendas de pessoas em situa& & o de sem-abrigo na Avenida Almirante Reis, que foi associada à visita do Papa Francisco à capital portuguesa para a Jornada Mundial de Juventude (JMJ) –, tamb& m as autoridades francesas est& o a ser acusadas de quererem expulsar os sem-abrigo à for& a para os esconder da vista daqueles que v& o participar ou assistir aos Jogos Olímpicos de 2024.
O mesmo aconteceu na China, quando os sem-abrigo tamb& m foram varridos das ruas antes dos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008. Ou ainda no Rio de Janeiro, onde foram for& ados a abandonar as & reas mais turísticas durante os Jogos Olímpicos de 2016.
De acordo com o Le Monde, o Governo franc& s tem vindo a solicitar desde mar& o deste ano a oficiais de todo o país a cria& & o de “acomoda& ões regionais tempor& rias” para alojar os sem-abrigo de Paris durante o grande evento. Entre abril e setembro, mais de 1800 pessoas sem-abrigo, a maioria dos quais migrantes, foram deslocadas de Paris para outras regiões de Fran& a e estima-se que estejam a ser levadas at& 150 pessoas por semana para outras cidades do país.
Segundo a AFP, na altura, o ent& o ministro da habita& & o Olivier Klein expôs no Parlamento franc& s que esta era uma a& & o necess& ria, uma vez que muitos hot& is de Paris, normalmente usados como acomoda& & o de emerg& ncia para estes sem-abrigo, pretendem libertar espa& o para receber turistas e aficionados.
A capacidade dos hot& is disponíveis para acomodar sem-abrigo “vai cair em cerca de tr& s a quatro mil camas devido a estes eventos”, disse, sublinhando ser necess& rio “preparar a situa& & o”, criando espa& os para quem precisa de estadia de emerg& ncia.
Os sem-abrigo ao longo da história, uma defini& & o que evolui
O fenómeno dos sem-abrigo em Fran& a enquanto conceito & relativamente recente, mas tem as suas raízes nos mendigos e vagabundos da Idade M& dia e & quase sempre associado a comportamentos errantes e à delinqu& ncia.
Mas como surgiu este termo? “Sem-abrigo” & na verdade a tradu& & o do termo ingl& s “homelessness”. “A partir dos anos 1980, na Am& rica do Norte, tornou-se um termo gen& rico correntemente utilizado”, explicou John David Hulchanski, professor da Universidade de Toronto, na revista da FEANTSA, acrescentando que nessa altura de maior precariedade torna-se necess& rio nos países do Ocidente “dar um nome ao aumento evidente do n& mero e da diversidade de pessoas que se encontram sem casa”.
Em Fran& a, os velhos termos “vagabundo”, “clochard” (termo franc& s que designa aquele que vive numa cidade sem trabalho nem habita& & o), ou “mendigo”, ligados à marginalidade, j& n& o s& o suficientes ou adequados para retratar a realidade. Mas tamb& m o conceito de “sem-abrigo” se tornou demasiado restrito. Inicialmente associado às vítimas de cat& strofes naturais, encontra-se ent& o cada vez mais em desuso, concorrendo agora com uma outra designa& & o: os SDF ou “sem domicílio fixo”.
Esta denomina& & o propaga-se sobretudo “desde h& uma dezena de anos, essencialmente a partir dos trabalhos realizados pela FEANTSA”, refere o sociólogo Julien Damon, citado pelo Le Monde.
Esta federa& & o europeia trabalha na evolu& & o da exclus& o ligada à habita& & o na Europa, bem como na tomada de decisões dos poderes p& blicos nesta mat& ria. “Como a FEANTSA utilizava muito esta palavra, a sua utiliza& & o progrediu entre os peritos e depois entre os decisores políticos. É assim que come& a a entrar na linguagem comum”, acrescenta.
O historiador franc& s Andr& Gueslin tamb& m tra& a a evolu& & o ao longo dos s& culos dos v& rios significados que a pobreza adota: dos mendigos e vagabundos da Idade M& dia, passando pela figura do “clochard” aos “sem-abrigo” do início do s& culo XXI.
No livro D’ailleurs et de nulle part, publicado em 2013, Gueslin escreve que no final da Idade M& dia o aumento da pobreza, determinado em grande parte por crises económicas, epidemias e acidentes clim& ticos, tem o efeito de alterar as representa& ões da pobreza. A figura do vagabundo & cada vez menos tolerada, al& m do sentimento de inseguran& a que transmite por questões de delinqu& ncia e crime. Essas mudan& as de representa& & o em rela& & o a vagabundos e mendigos anunciam o tempo da repress& o e da demoniza& & o.
Com o advento da sociedade industrial e as suas repetidas crises, o n& mero de vagabundos em Fran& a acentua-se, com as popula& ões mais pobres dos meios rurais a migrarem para as cidades. Pris& o para os mais capazes, o hospício para os idosos e o hospital para os doentes: estes s& o os destinos comummente observados neste mundo de quem vagueia pelas cidades, retrata o autor.
Só no final do s& culo XIX e início do s& culo XX, com o estabelecimento gradual do Estado social se garante a prote& & o contra muitos dos riscos sociais associados à pobreza, invalidez, e ao desemprego, etc. Menos numerosos nesta & poca, os vagabundos tamb& m s& o mais aceites na sociedade.
O & ltimo período tratado por Gueslin, de 1970 at& à atualidade, & marcado por um aumento da pobreza desencadeada pela crise de 1973 que, na sua perspetiva, anuncia para as próximas d& cadas o surgimento de uma nova categoria de pobres, os “sem-abrigo”. Aos efeitos das crise económicas que se seguem junta-se ainda a fal& ncia de uma política habitacional.
O que você está lendo é [Sem-abrigo em Fran& a. Dos vagabundos da Idade M& dia aos & sem residência fixa& atuai].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.
Wonderful comments