Ministros pressionaram Bolsonaro em reunião a se vacinar contra Covid

Em 15 de junho de 2023, o Brasil atingiu a marca de 488 mil mortes pela Covid-19. A vacinação, iniciada em janeiro, começava a engrenar, mas ainda estava distante da universalização. Naquele dia, 34,6% da população estava imunizada com a primeira dose e apenas 14,8% também com a segunda.

Na véspera, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, havia se deixado fotografar, com peito aberto e mamilo exposto, sendo vacinado pelo então ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.

"Muso da imunização", resumiu a Primeira Página da 💥️Folha impressa. A cena era parte de uma tentativa do governo de atenuar a imagem negacionista que emanava do chefe, Jair Bolsonaro.

A imagem de Campos Neto rendeu brincadeiras e comentários irônicos de membros do governo que chegavam para uma reunião ministerial no Palácio do Planalto, marcada para as 8h daquele dia.

Agendado havia alguns dias, era um encontro rotineiro da equipe para discutir temas como economia e, inevitavelmente, a resposta do governo à pandemia, muito criticada pela postura do chefe de Estado e pelas falhas logísticas na distribuição das vacinas.

Participavam 22 ministros, mais os presidentes dos bancos públicos (inclusive o próprio Campos Neto) e o dos Correios. Como já de praxe, o vice-presidente, Hamilton Mourão, estremecido com Bolsonaro, não foi convidado.

Naquela manhã, o que começou como uma conversa descontraída acabou se tornando um questionamento explícito da equipe ministerial sobre a recusa de Bolsonaro em se vacinar.

Segundo participantes da reunião que conversaram com a 💥️Folha em caráter reservado, a pressão dos subordinados fez com que pela primeira vez o presidente tivesse dado sinais de que poderia se imunizar publicamente –embora isso, no fim, jamais tenha ocorrido.

Um dos primeiros a puxar o tema foi Ricardo Salles, do Meio Ambiente, que deixaria o cargo dali a um mês, em meio a suspeitas de participação em um esquema de exportação ilegal de madeira da Amazônia.

"Presidente, antes de começar a reunião, queria fazer uma proposta", disse.

"Fala aí, Salles", respondeu Bolsonaro.

"O senhor poderia aproveitar essa onda gerada pelo Campos Neto e, já que tem físico de atleta, também ser vacinado sem camisa pelo Queiroga", afirmou.

A referência era a uma polêmica declaração do então presidente no início da pandemia, quando chamou a Covid de gripezinha e disse que não teria problemas se pegasse a doença por ter "histórico de atleta".

Ouviram-se risadas discretas na sala, inclusive de Bolsonaro, que nada falou.

Salles arrematou: "Isso vai ajudar a virar a narrativa contra o governo na pandemia. O senho não precisa falar nada, só se deixar fotografar".

Com o presidente calado, outros pediram a palavra. Fábio Faria, das Comunicações, foi enfático ao ligar o tema da pandemia à campanha eleitoral do ano seguinte, em que Bolsonaro disputaria a reeleição.

Disse que o cenário econômico era muito bom e que o Brasil começava a reagir com as medidas tomadas pelo governo, como o auxílio emergencial de R$ 600 para pessoas que haviam ficado sem renda.

Mas um dos temas centrais da eleição, argumentou, seria a pandemia, e não adiantaria listar notícias positivas se o próprio presidente parecia não acreditar na eficácia dos imunizantes. "Eu acho que, se o senhor não se vacinar, a gente corre o risco de perder", decretou, numa fala que se revelaria profética.

Também se manifestaram em seguida, entre outros, Tereza Cristina (Agricultura), Augusto Heleno (GSI), João Roma (Cidadania) e Paulo Guedes (Economia) —este, o único que usava máscara o tempo todo.

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O recado geral da equipe era o de que Bolsonaro tinha inadvertidamente caído numa armadilha. Tantas foram as críticas e ressalvas feitas por ele contra a vacina que não importaria o que seu governo fizesse, a pecha de negacionismo estava grudada.

A recusa do presidente ofuscava, por exemplo, a ação do governo federal para comprar vacinas em grandes quantidades e fazer sua aplicação em massa.

Após fazer campanha contra a Coronavac, desenvolvida pelo Instituto Butantan e promovida pelo então governador de São Paulo, João Doria (à época no PSDB), o Ministério da Saúde estava investindo em outras marcas, como a AstraZeneca.

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