Justiça que não vê e não escuta está sendo racista, diz pesquisadora

Uma Justiça de olhos vendados, que não distingue cor nem raça, não contempla as necessidades da sociedade brasileira, em que o racismo permeia estruturas sociais e econômicas. O argumento é de Carla Akotirene, doutora em estudos de gênero pela Universidade Federal da Bahia, que se define como "militante acadêmica".

A pesquisadora questiona a imagem da deusa grega Têmis que, com os olhos cobertos e uma balança em mãos, é usada para representar a imparcialidade. "A Justiça que não vê e não escuta está sendo racista."

Em seu livro lançado em janeiro, "É Fragrante Fojado Dôtor Vossa Excelência", ela critica o funcionamento do sistema jurídico brasileiro a partir de sua pesquisa na Vara de Audiência de Custódia do Tribunal de Justiça da Bahia.

A autora diz que o procedimento, principal porta de entrada para o encarceramento em massa de pessoas negras, é uma "cena colonial". A desigualdade começa no ato da prisão, segundo ela, e é visível no tratamento dado às pessoas negras, que têm sua aparência e seu relato colocados em dúvida.

Foi o que Akotirene observou no trabalho de campo em que conta ter visto flagrantes de brancos quase sempre resultarem em relaxamento da prisão, enquanto o mesmo não acontecia com pessoas negras.

Nesse tipo de audiência, implantada no Brasil em 2015, a pessoa presa em flagrante é apresentada a um juiz, com a participação do Ministério Público, da Defensoria ou de um advogado para assegurar a legalidade da prisão.

Uma Justiça que opera com base em uma herança histórica e filosófica branca falha em assistir um país no qual mais da metade da população é negra, afirma Akotirene. Por isso, ela utiliza o simbolismo de religiões de matriz africana para falar dos desafios que pretos e pardos enfrentam em procedimentos jurídicos. "Por que a Justiça não pode vir na figura de um homem preto?"

A partir dessa questão, ela apresenta Xangô, orixá da justiça, como contraponto à ideia de uma imparcialidade branca e de olhos vendados, como Têmis. Deus dos raios, Xangô é um guerreiro e tem um machado em mãos.

Na filosofia de povos africanos como os iorubás e bantos, exemplifica, a justiça está ligada a uma vigilância constante para manter o funcionamento da comunidade. "Se alguém cometeu um delito é porque não houve uma preocupação com equilíbrio social."

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