O desconforto com a greve nas universidades federais

Ao menos 52 universidades e 79 institutos federais encontram-se em greve. Como campo de batalha, a greve é ao mesmo tempo justa e problemática, especialmente em meio a um governo supostamente de esquerda, de origem sindical e trabalhista.

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Para quem vive o cotidiano universitário é visível o desconforto de muitos colegas com a greve. Na Universidade Federal de Pernambuco, onde trabalho, a votação digital sinalizou um quase empate. A iniciativa da paralisação ganhou por pouco na semana passada.

Em governos tucanos ou bolsonarista, era comum ver a universidade em peso contrária ao governo, mas com o PT é diferente.

Um componente do drama particular desta greve é que parte da burocracia federal sindicalizada é claramente contra o movimento. O petismo, forjado no cotidiano do mundo do trabalho, ainda tem forte penetração em vários sindicatos e em muitas reitorias espalhadas pelo país, que estão pressionando o movimento grevista com ameaça de corte de ponto e estimulando o denuncismo de colegas.

As razões para não fazer a paralisação são muitas. Alguns consideram que não é o momento de acirrar os ânimos e radicalizar a política já tão polarizada. Outros argumentam que nenhum sindicato da classe ousou fazer greve contra Bolsonaro, que constantemente atacou e depreciou a categoria. Por que deveriam fazer greve agora, sob um governo supostamente de esquerda?

O que pega para muitos professores e técnicos das universidades e escolas técnicas é que o apoio eleitoral dado a Lula parece não ter nenhum valor político mais pragmático. Historicamente, boa parte dos funcionários federais se veem como apoiadores do petismo. Funcionários públicos são quase sempre associados a uma espécie de voto seguro, um tipo de apoio que jamais penderá para o lado bolsonarista.

Um dado que ajuda a complexificar o embate é que setores tidos pelo PT como "golpistas" tiveram aumentos consideráveis e foram cortejados por Lula. Auditores fiscais, policiais, setores do Judiciário: todos ganharam seu naco através da postura conciliatória do governo federal. Esperava-se que Lula acenasse também em direção a seus aliados tradicionais e não apenas buscasse cooptar setores adversários com benesses populistas. Mas isso não aconteceu, o que gerou insatisfação de muitos. Como sintetizou uma amiga minha, professora universitária: "A gente tem corte no salário, corte no orçamento, corte na pesquisa. Alguma coisa boa tem que ter pra nós. Não se pode cortar tudo".

Mas o governo não pensa assim. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já declarou que não há margem para conceder o desejo dos servidores. O paradoxo é que meses atrás o mesmo governo, que agora diz não haver dinheiro, bateu bumbo para proclamar que o Brasil tinha voltado a crescer acima do esperado e que conseguimos voltar ao ranking das dez maiores economias do mundo. E houve recorde de arrecadação de impostos. Dinheiro há. Então quais são as prioridades do governo? E, sobretudo, qual é o projeto de esquerda para a educação pública nacional?

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