Museu Penitenciário Paulista é um lugar de esquecimento
O Museu Penitenciário Paulista, localizado na entrada do Parque da Juventude, que ocupa a área do antigo presídio do Carandiru, é um lugar de esquecimento. É também uma aula de desinformação na qual presos são tratados como seres degenerados e condenados geneticamente e o sistema carcerário visto como uma estrutura exemplar que se renova e evolui.
Não há, por exemplo, uma única referência no museu ao Massacre do Carandiru, em 2 de outubro de 1992, um ataque despropositado da Polícia Militar para conter uma rebelião no presídio que levou 111 detentos à morte.
Não se discute tampouco as condições insalubres das prisões e nem se propõem formas de aprimoramento do sistema, a fim de torná-lo mais humanizado. Nada se fala sobre as cadeias abarrotadas com presos aguardando julgamento ou cumprindo penas desproporcionalmente longas para o crime cometido.
Reinam no museu dois italianos que deram combustível a ideias eugenistas. O primeiro é o psiquiatra Cesare Lombroso, com suas teorias sobre o criminoso nato, aquele sujeito com pendor homicida ou com tendência natural para o roubo, que podia ser identificado pelas suas características físicas.
O outro é o médico Nicola Pende, criador do termo biotipologia, que também identificava sinais visíveis de predisposição ao crime em indivíduos com determinadas feições e atribuía aos hormônios uma função central para a vocação delitiva.
Os dois merecem painéis com menções honrosas na entrada do museu. Lombroso, que defendia o caráter hereditário da delinquência, institucionalizou o racismo e promoveu a criminalização seletiva que ainda permeia a sociedade atual.
Ele ilustra uma seção sobre tatuagens, prática que considerava condenatória por si mesma. São mostradas imagens recorrentes usadas pelos detentos, mas não se fala que a situação mudou e desenhar na própria pele é algo que se tornou corriqueiro.
A ciência que circula no museu é a do começo do século 20 e parece que nada se alterou de lá para cá. A expressão direitos humanos inexiste. Problemas como violência nas cadeias, disputas de facções criminosas e consumo de drogas nas unidades prisionais são ofuscados por quadros pintados por detentos e mensagens religiosas que viram símbolos de ressocialização.
É um museu que apresenta um lado só. Não faz qualquer autocrítica ao modelo prisional e se limita a expor platitudes sobre a "doença" da criminalidade. Os vícios do sistema carcerário não são mostrados e nem seus excessos. O que se vê são os objetos usados pelos presidiários para ludibriar a vigilância e cometer atos violentos dentro da prisão, tratados como fetiches.
O museu faz parecer que o sistema carcerário funciona e que evoluiu de maneira consistente e virtuosa ao longo do tempo, quando se sabe que a realidade é outra.
Um dos destaques da exposição é uma imagem do bispo Edir Macedo na cadeia. Ele foi preso em 24 de maio de 1992, depois de um culto evangélico em um antigo templo da Igreja Universal do Reino de Deus, localizado no bairro paulista de Santo Amaro.
Acusado de charlatanismo, estelionato e curandeirismo, foi solto onze dias depois. As acusações contra ele foram arquivadas por falta de provas.
Macedo está ali para mostrar que a religião é um caminho de regeneração e sobre sua imagem há um texto onde se lê que ao longo de 30 anos milhares de presos foram batizados e hoje fazem um trabalho voluntário de evangelização nas mesmas cadeias onde estiveram encarcerados.
Há espaço no museu também para a Assembleia de Deus, para o catolicismo e para as religiões afro-brasileiras, mas com muito menos destaque do que para Macedo, apresentado como um caso isolado de prisão injusta. A religião pode ajudar muitos detentos, mas não resolve o problema agudo dos presídios.
O Museu Penitenciário teve sua gênese com a criação do Serviço de Biotipologia, em 1939. Isso mostra que ele está amparado em um pensamento ultrapassado e não é capaz de dar uma resposta às novas demandas sociais. Diversidade e minorias não fazem parte de seu vocabulário.
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