Estamos diante da hora histórica, prestes a definir se teremos um futuro

Há anos vigiamos o tempo, sentimos seu estremecimento, tememos seu colapso. Há anos damos máxima atenção a cada acontecimento, vemos a importância extrema das notícias diárias, sofremos diante dos vestígios de uma destruição em processo. Estamos consumidos, exauridos, descentrados, alienados de nós mesmos. Estamos atentos ao mundo sem descanso possível, como se fosse preciso espiá-lo a cada segundo, como se ele pudesse desmoronar a qualquer momento, nos minutos escassos em que nos distraímos, ou nas horas de sono ainda turbulentas. Há anos vigiamos o tempo com desespero, na esperança discreta de algum sossego.

Estamos à espreita do relógio do mundo, empenhados em saber a hora exata em que vivemos. Não nos basta conhecer algo da época, vislumbrar o movimento dos séculos ou das décadas: nossa obsessão é o presente imediato, é saber a hora histórica com precisão de ponteiros. "Que horas são?" é a interrogação que Roberto Schwarz leva ao título de um de seus grandes livros, enunciando uma das razões fundamentais por que escrevemos, por que lemos, por que pensamos. Queremos a todo instante descobrir a hora do mundo, e a hora do país que habitamos, porque só assim distinguiremos o que pensar, o que sentir, e como responder aos imperativos cotidianos. Todo momento é decisivo para que saibamos reagir ao turbilhão de pequenas ocorrências.

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E, então, eis que se aproxima uma hora histórica, eis que nos defrontamos com um acontecimento imenso, um dos maiores das nossas vidas. Este domingo estaremos à espreita de relógios literais, à espera da decisão que afetará em incontáveis aspectos toda a nossa existência. Cabe agora aceitar a responsabilidade do momento, suportar seu peso, e quem sabe encontrar algum prazer no convite à ação que se apresenta: é deste vago e abrangente nós que depende o desfecho. E o que faremos, então, com o protagonismo que enfim alcançamos, como responderemos à hora histórica que nos convoca com tanta veemência? Depois de anos de vigília e tormento, como reagiremos ante tudo o que testemunhamos, tudo o que sofremos e o que ainda há para sofrer?

Sobre a hora histórica do país, talvez já não haja muito mais a dizer, talvez não caiba afirmar de novo a urgência de interromper o projeto político em andamento, destrutivo e violento, insensível ao extremo. Mas se a hora do país ainda parece imprecisa para alguém, desnorteado por tanto ruído, pelo torvelinho de informações atravessadas e discursos equívocos, talvez lhe convenha tentar captar algo mais amplo: a hora histórica do planeta. Não somos só nós os que estamos atentos ao mundo, o mundo também está atento a nós sem descanso possível. Os atentos do mundo estão insones e nos observam com desespero, temendo que aqui tenha início o fatídico desmoronamento.

Eles sabem que neste domingo não se decide apenas o destino de um país que alguma vez lhes pareceu simpático. Sabem que se decide um destino mais vasto, da maior floresta existente, da maior reserva de água doce, de toda uma imensidão essencial ao equilíbrio climático e à sobrevivência no planeta. Sabem que, ao menos nesse ponto, os projetos em disputa têm um contraste absoluto. Um candidato quer continuar a destruir em nome da soberania ou do lucro, em defesa de um suposto desenvolvimento sem qualquer futuro. O outro quer se unir aos esforços do mundo em criar uma economia alternativa, sustentável, antidestrutiva, embora tenha consciência de estar diante de um desafio interminável, o maior da nossa época.

Faltam cem segundos para a meia-noite no relógio do apocalipse — a contagem metafórica que comprime toda a existência em 24 horas e indica quão próximos podemos estar do fim do mundo, ou da dizimação da humanidade. Por que estamos tão obcecados com o presente imediato, com a hora histórica? Talvez porque sintamos que nosso tempo se estreita, que logo pode não nos restar nenhum futuro. Mas a boa notícia é que esse relógio também retrocede, em resposta precisa às nossas ações, às medidas que tomamos. Eis a hora histórica que viveremos neste domingo: nele podemos avançar ainda mais em direção ao apocalipse, à destruição do país e do mundo; ou recuar valiosíssimos segundos e assim experimentar um momento de sossego.

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