No front nos consideramos irmãos: guerra aproxima ucranianos e ciganos

Em Radvanka, um bairro cigano da cidade ucraniana de Uzhgorod (oeste), um soldado dessa minoria discriminada exibe com orgulho uma medalha militar concedida pelo presidente Volodimir Zelensky.

"Quase morri quatro vezes", conta à AFP Viktor Ilchak, que lutou por oito meses e ainda carrega no braço estilhaços de uma bomba quando defendia a cidade de Mariupol, hoje ocupada pela Rússia.

De acordo com ONGs ciganas em Uzhgorod, soldados como Ilchak e grupos que ajudam refugiados ucranianos estão apagando preconceitos em torno desta minoria e abrindo caminho para uma reaproximação.

"No front, não importa se você é cigano, todos nos consideramos irmãos", disse Ilchak, pai de quatro filhos que admite ser analfabeto.

"Muitos duvidavam que um cigano que não sabe ler ou escrever pudesse lutar no exército. Muitos estão surpresos com o fato de os ciganos estarem lutando", contou o mecânico de tanques da 128ª Brigada da Transcarpátia.

Grupos ciganos em Uzhhorod, a maior cidade da Transcarpátia, região ucraniana que abriga a maior comunidade cigana do país, notaram uma mudança de atitude devido à guerra.

"Muita gente começou a dizer nas redes sociais coisas como 'os ciganos ajudaram os ucranianos, isso é incrível'", comentou Anzhelika Bielova, que dirige a organização Voice of Romni.

A ONG, que ajuda jovens ciganos a conseguir um espaço no mercado de trabalho, passou a auxiliar, também, refugiados não ciganos impactados pelos conflitos na Ucrânia.

Associações como a de Bielova calculam que há cerca de 400.000 ciganos espalhados pelo país.

Deste total, quase 170.000 tiveram que deixar o leste e sul da Ucrânia, um movimento forçado que veio acompanhado da pobreza, discriminação e segregação nas fronteiras com os países vizinhos e em áreas com ajuda humanitária.

"Nossa organização ajudou muito os ucranianos (...) Muitos em nossa equipe são deslocados internos, sabemos como é difícil viver em um novo lugar", disse Bielova, uma refugiada de Zaporizhia.

Mudança de opinião

Em Radvanka, Eleonora Kulchar administra um abrigo aberto a todos, independentemente de sua origem.

A mulher de 54 anos inaugurou o local em março para auxiliar seu "próprio povo" que não estava recebendo ajuda na estação de trem de Uzhgorod enquanto fugiam, antes de começarem a aceitar a todos.

"Aqueles que viram ciganos defendendo a Ucrânia ou ajudando refugiados ucranianos mudam de ideia sobre nós", disse Kulchar, responsável pela educação cigana da organização Blago.

Quase metade dos 70 residentes do abrigo, financiado por doações, são famílias não ciganas de Mariupol, Berdiansk e Kherson.

Uma família conta que chegou ao local em novembro, depois que não conseguiu encontrar um quarto em Uzhgorod, onde os hotéis eram ocupados por deslocados internos.

"Ficamos um pouco assustados porque não tínhamos contato com os ciganos, mas depois vimos que estava tudo bem", lembrou Veronika Komarnitskaya.

No quintal, seu filho de 10 anos, Nikita, joga futebol com crianças ciganas e até aprendeu algumas palavras em seu idioma.

"A guerra nos aproximou, antes eu não teria acreditado que isso poderia acontecer", admitiu ele.

Ainda assim, Bielova teme se esta reaproximação será duradoura.

"Depois que vencermos a guerra, haverá muito trabalho, temos que educar os ucranianos sobre direitos humanos e dignidade se quisermos ingressar na União Europeia", concluiu.

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