É a dança do maxixe: quem foi a 1ª brasileira a fazer furor em Paris?

Sua entrevista ao jornal A Noite em 1933 sobre a viagem a Paris dá o tom dos frequentes episódios de racismo que enfrentava, enquanto uma mulher negra de pele clara, e como precisou achar formas para alcançar uma carreira sólida no fim do período escravocrata brasileiro: "Os cartazes anunciavam uma 'atriz crioula' e o público, naturalmente, supôs que ia ouvir uma negra, de grandes beiçolas. Ao ver-me, a plateia deixou escapar um 'oh!' de admiração. Compreendi tudo e dominei-me. Cantei com desenvoltura e agrado geral."

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Plácida dos Santos nasceu na cidade de Bagé, no Rio Grande do Sul, na década de 1860. Entre o final do século 19 até os anos 1920, os registros mostram que ela se apresentava cantando e dançando em casas de espetáculo, principalmente da Praça Tiradentes e da Lapa, no Rio de Janeiro. A previsão é de que tenha falecido entre as décadas de 1940 e 1950.

Fora da história da música

Plácida dos Santos, em 1901. - Acervo Instituto Moreira Salles. - Acervo Instituto Moreira Salles. Repertório de Plácida dos Santos.

No Brasil, uma das principais pesquisadoras de Plácida é Juliana Pereira, doutora em história pela Universidade Federal Fluminense. Uma pequena biografia da artista foi escrita pela acadêmica na sua tese de doutorado, que virou o livro A Era do Maxixe (Casa Editorial).

Para ela, embora tenha obtido sucesso artístico, o fato de ser uma mulher negra impediu mais espaço e fama à artista. "Plácida até teve ascensão financeira, o que lhe permitiu uma velhice com estabilidade, mas já na década de 1920 cai no esquecimento. Ela vai ser lembrada na década de 1933 quando foi entrevistada pelo jornal A Noite. Depois dessa entrevista, as informações sobre Plácida desaparecem", aponta.

Artistas negras na arte

Como uma mulher negra em um país marcado pela experiência da escravidão, Plácida fazia parte de um contexto mais amplo de disputas e conflitos, no qual estavam em jogo o reconhecimento como cidadã na nação republicana.

Dentro do que era possível, a artista levou para o palco um repertório que valorizava ritmos afro-diaspóricos, como lundus, dança e canto de origem africana trazido ao Brasil pelos escravizados angolanos, e maxixes, em diálogo com o que havia de mais moderno em termos musicais. Nas fotografias fazia questão de posar com roupas elegantes a fim de evidenciar a importância da artista que era. Se afirmava como uma mulher moderna e bela.

Em sua tese, Pereira aponta para uma das músicas que fazia parte do repertório da artista: a canção "Machuca", de 1901, com letra de José do Patrocínio Filho e música de Chiquinha Gonzaga. Na parte superior direita da partitura afirmava-se que a música era oferecida para "a gentilíssima e distinta artista Plácida dos Santos".

Entre o final do século 19 e o início do século 20, as mulheres que atuavam na indústria de entretenimento tiveram de lidar com os modelos de moralidade feminina e suas múltiplas formas de ação dentro de toda a engrenagem machista que movimentava esse mercado. A profissão de artista era observada pelos setores conservadores da sociedade com certa desconfiança. Constantemente mulheres artistas tinham sua honestidade contestada.

Não foi diferente com Plácida, que foi mãe e separou-se de seu parceiro em um período que isso não era comum. Por cantar músicas picantes e frequentar clubes dançantes, era considerada nos jornais como uma mulher boêmia.

"Em meio à essa construção de estereótipos de gênero e raça, Plácida dos Santos fez do palco um caminho de afirmação de respeitabilidade. Ela lidou com diferentes opressões e conseguiu se inserir no meio artístico", cita a biógrafa.

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