Sexo, armas e meditação: ex-integrantes acusam comunidade do Osho no RS de abusos e agressões

É domingo de manhã e 30 pessoas tiram as roupas, colocam vendas nos olhos e se deitam no chão de um amplo salão com piso de madeira em meio ao verde da zona rural de Viamão, na Grande Porto Alegre (RS).

Uma música dá o clima e embala as primeiras carícias, que viram pegação. Quem ergue o braço recebe na mão uma camisinha.

O que pode parecer uma suruba organizada era tratado pelo grupo como um processo terapêutico, parte da Maratona de Potencial Sexual, iniciada dois dias antes entre membros da Comunidade Osho Rachana, a cerca de 40 quilômetros da capital gaúcha.

O sítio, que já foi casa para mais de cem pessoas, a maioria entre 25 e 35 anos, foi comprado em 1991 por um grupo de discípulos de Osho (1931-1990), o controverso líder espiritual indiano apelidado de "guru do sexo", que pregava o materialismo espiritual e teve mais de 90 carros Rolls-Royce.

Nos anos 1970 e 1980, Osho converteu multidões de jovens ao seu movimento rajneesh, que criticava a religião e educação tradicionais, pregava o amor livre e prescrevia meditações ativas. Batizados com nomes em sânscrito, eles eram organizados em comunidades fechadas, uma delas retratada na premiada série documental "Wild Wild Country", da Netflix.

Este modelo inspirou a comunidade gaúcha de Viamão, conhecida nas redondezas como "sítio dos pelados". A alcunha se deve à centralidade do sexo na proposta terapêutica do grupo. Um método próprio que mistura elementos da terapia bioenergética, baseada nas teorias do psicanalista austríaco Wilhelm Reich (1897-1957), com as meditações ativas criadas por Osho. Durante a pandemia, como na série, a cúpula da comunidade gaúcha comprou armas para se defender de potenciais ataques, depois apreendidas pela polícia.

O ponto-chave é a prática de uma sexualidade livre e de exercícios capazes de desmanchar travas e traumas fruto de repressões na infância e adolescência.

"Tudo na sua vida passa a ser explicado a partir de questões sexuais. E a cura de tudo é por meio do sexo", sintetiza Camila Costa Silva, 35, que viveu na comunidade de 2015 a 2023. "Se algo não vai bem, a solução é transar. A filosofia é que quem transa mais e melhor é mais feliz e não tem depressão."

Os terapeutas da Comuna, como é chamada, não têm formação em psicologia nem em psicanálise ou em psiquiatria. Eles são formados num método próprio por um de seus criadores, Prem Milan, 68, nascido Adir Aliatti e convertido ao movimento de Osho.

Sessões como a do início deste texto, tal como descritas à Folha por ex-moradores, são coordenadas por Milan. Sentado numa poltrona de veludo roxo sob um grande quadro do Osho, ele observava a movimentação dos jovens nus no chão entre baforadas de cigarro eletrônico.

"Nesse tipo de sessão, muita gente fica com um pouco de nojo ou medo, mas vai porque tem que ir", afirma a artista Mariana Lannes, 30, que viveu por nove anos na Osho Rachana. Quem dá para trás, explica, é confrontado por Milan e pelos terapeutas mais graduados: "Você não quer se abrir", "é careta como teus pais".

"A pessoa se convence de que precisa romper. Fica fanática, querendo transformar sua sexualidade porque acredita que, com isso, vai dar um salto na sua vida", completa ela.

Camila e Mariana fazem parte de um grupo de 16 ex-integrantes da comunidade que se reuniu para denunciar abusos e violências que afirmam ter sofrido no que hoje chamam de seita. Eles passaram entre 3 e 14 anos envolvidos com o método, e alguns viveram dez anos no sítio de Viamão.

Em depoimentos à Folha, descrevem uma rotina de manipulações, humilhações, exploração do trabalho e episódios de agressão física que dizem só hoje enxergar como incompatíveis com um processo terapêutico. Alegam ter sofrido e testemunhado coerção, ameaças e práticas de "cura gay".

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