Por que atrapalhamos a redução da desigualdade?

Gostaríamos de ser um país onde os mais vulneráveis que querem trabalhar trabalham? Ou um país no qual apenas destinamos renda aos mais vulneráveis? Ou gostaríamos de prover ambos aos mais vulneráveis, trabalho e transferência de renda, até que todos alcançassem um patamar mínimo desejável?

A Constituição estabelece em seu artigo 6º que "todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar". Demos um grande passo na direção de um mínimo para todos, o próximo passo é estabelecer o que estamos chamando de mínimo.

Se considerarmos que todas as pessoas deveriam ter ao menos R$ 300 por mês, temos 22,3 milhões de pessoas com esse direito violado, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc) de 2022. Eles representam 10% da população brasileira.

A Pnad Contínua também pergunta a esses mesmos 10% em condição de vulnerabilidade e que estão em idade de trabalhar se eles gostariam de ter uma ocupação. A resposta é surpreendente: 5,5 milhões de querem trabalhar e 64% deles afirmam que tentam, mas não conseguem.

Sendo o Brasil um dos países mais desiguais do mundo, qual a razão de não garantir o direito ao trabalho dessas pessoas que já estão sem um mínimo constitucional? Atrapalhamos a nós mesmos na garantia desse direito e na perspectiva de dar a chance ao país de caminhar na direção de mais igualdade.

De acordo com a ONU, o Brasil está no 14º lugar de maior desigualdade, empatado com o Congo. Por qual razão estaríamos dificultando o acesso ao trabalho dos mais vulneráveis? Temos algum ganho ao violar o direito ao trabalho da população que quer trabalhar?

A resposta é que não. Se simularmos através dos dados da Pnad Contínua de 2022 que os 5,5 milhões de vulneráveis brasileiros que querem trabalhar conseguem um trabalho com a mesma remuneração que outras pessoas em vulnerabilidade que estão ocupadas, podemos estimar o quanto estamos deixando de ganhar monetariamente.

Ao simular que os brasileiros vulneráveis sem trabalho conseguem uma remuneração idêntica à dos brasileiros vulneráveis que estão ocupados, notamos que hoje perdemos R$ 30 bilhões por ano. Esse valor provavelmente é muito maior se considerarmos as externalidades sociais que 5,5 milhões de pessoas trabalhando podem gerar, como benefícios à educação, saúde, cultura de paz, entre outros.

Demos um passo importante na direção de garantir o direito à uma renda básica, no entanto, a Constituição deixa claro que não menos importante é o direito ao trabalho. As implicações para a política pública são grandes e imediatas.

Primeiro, é importante analisar o mecanismo de ligação da transferência e da inclusão produtiva. Caso uma mãe com um filho pequeno consiga um trabalho por R$ 450 mensais e declare corretamente esta renda ao governo, ela perderá os R$ 750 de transferência do Bolsa Família. Não só a família é incentivada a não declarar corretamente a renda como o desincentivo ao trabalho fica evidente. Não deveríamos premiar e incentivar os poucos vulneráveis que estão conseguindo se alocar profissionalmente? Um exemplo seria manter seu benefício com uma regra de saída do Bolsa Família suave.

Segundo, não podemos deixar os beneficiários do Bolsa Família desassistidos na busca de sua reinserção profissional. Acoplado ao Bolsa Família, precisamos de um programa de inclusão ao trabalho, que entenda a causa e resolva o motivo do impedimento desses brasileiros vulneráveis que querem trabalhar e não conseguem. Isso envolve serviços de intermediação de mão de obra, arranjos produtivos locais, qualificação profissional, entre outras políticas que o Brasil já tem.

Com a grande diferença de, dessa vez, centralizarmos os esforços, de uma vez por todas, na necessidade de quem mais precisa primeiro. O artigo 6º é claro ao dizer que tanto a renda mínima quanto o trabalho são direitos sociais.

O que você está lendo é [Por que atrapalhamos a redução da desigualdade?].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.

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