Milei transformou a economia argentina numa panela de pressão

A inflação argentina desacelerou de 25%, em dezembro, para 11%, em março, mas acumula 276% em 12 meses. Analistas apontaram o primeiro superávit fiscal em 15 anos (0,2% do PIB no primeiro trimestre de 2024) como causa da perda de ritmo da inflação.

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É claramente uma falácia. Com gastos públicos congelados e remarcação de preços liberada (que produzem mais arrecadação ao governo), a inflação produz quase sozinha esse resultado positivo (o efeito Olivera-Tanzi às avessas).

Segundo dados oficiais, entre os meses de março de 2023 e de 2024, a arrecadação cresceu 254%, enquanto as despesas avançaram 177%. Os investimentos mergulharam 48% no período em termos nominais. A calamidade fica nítida se descontarmos a inflação de 300%.

A economia argentina é uma panela de pressão. A contração do PIB é prevista em 2,8%, e a pobreza já atinge 57% da população. Salários, pensões e gastos sociais correm muito atrás dos preços de energia, transportes, alimentos e itens de saúde. Neste primeiro trimestre, o consumo recuou 10% e derrubou as vendas no varejo.

O sincericídio dos preços e a retórica incendiária do presidente elevam a temperatura da sociedade. A válvula de escape é a frágil e insustentável combinação de minidesvalorizações cambiais e uma taxa real de juros negativa. Vejamos.

A taxa de câmbio argentina é fixada pelo banco central, o qual vem aplicando uma desvalorização rastejante ("crawling peg") do câmbio oficial —hoje, em 820 pesos por dólar— para reduzir a diferença com a taxa do mercado paralelo (1.150 pesos/US$). Quanto maior for essa diferença, mais dólares ficam fora das reservas oficiais.

De olho no início da safra agrícola, agora em abril, o ministro da Economia, Luis Caputo, vem depreciando a moeda ao ritmo de 2% a cada mês para incentivar os exportadores a repatriar os dólares obtidos com as vendas no exterior. Com isso, o aumento das reservas em moeda forte do país diminui o risco de crise cambial.

Todavia, a cada rodada de depreciação cambial administrada, os preços dos bens importados se elevam e disseminam a inflação para o restante da economia. A indexação formal e informal de preços e salários aumenta a pressão por novas rodadas de elevação de preços, realimentando a inflação. Lembra muito o Brasil pré-Plano Real.

Com isso, Milei ganha tempo para que a inflação em queda reúna força política para aprovar um plano de estabilização mais sólido. Contornando a resistência parlamentar em casa, Milei seduziu a elite financeira global e obteve um voto de confiança.

Sem o controle da taxa de câmbio, seria impraticável a redução da taxa de juros pelo banco central, de 133% em dezembro para 70% em abril, que busca contrair o pagamento de juros da dívida pública; ao reduzir a pressão fiscal (Faria Lima, fica a dica!), cai o financiamento por meio da emissão monetária.

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