Em casa, o emocionante divórcio amigável da banda mais gente boa do Brasil

Agora foi. Diante de 50 mil pessoas, Samuel, Henrique, Haroldo e Lelo enfim consumaram o divórcio anunciado há quase 4 anos. Adiada pela pandemia, a turnê de despedida do Skank terminou em casa, onde tudo começou.

Samuel Rosa pediu e foi atendido: não houve melancolia. Se o início algo religioso com a delicada "Dois Rios" insinuou um nó na garganta, a alta rotação da trinca "Uma Partida de Futebol", "Esmola" e "Pacato Cidadão" tratou de desatá-lo. Num abafado Mineirão outonal, o Skank arrancou cantando para fazer festa.

Às dez para as oito da noite, a banda para, pela primeira vez, para contemplar o estádio lotado. Aconteceria outras vezes. "Assim o coração não aguenta, já passamos dos 50, pessoal", anunciou Samuel Rosa. "É difícil explicar o que a gente está sentindo agora. Envelhecemos, e essa é uma palavra muito digna."

Casamento é rotina e 32 anos juntos são, em muitos sentidos, uma prova de resistência. Quarentão, o rock brasileiro já viu de tudo em termos de relacionamento. Uniões duradouras como o Capital Inicial, que bem ou mal segue na estrada e criando; casamentos de fachada como o da Blitz, que profissionalmente remexe as mesmas fotos do passado a cada show; abandonos espetaculares (O Rappa) ou a conta-gotas (Titãs); relacionamentos abertos, como a conjugação de grupo e carreira solo nos Paralamas; casais ioiô, como Scandurra e Nasi (Ira). Chegou a hora da separação amigável e racionalmente planejada. Um fim coerente para os bons moços da banda mais gente boa do Brasil.

Três décadas de caminhada exigem energia para se reinventar. À sua maneira, o Skank soube fazê-lo. A banda saltitante dos três primeiros discos deu lugar a um grupo de pop melódico na virada do milênio. A apresentação derradeira trouxe as duas encarnações em equilíbrio. O DNA jamaicano teve "Jackie Tequila", "O Beijo e a Reza", "Baixada News". "É Proibido Fumar" e "Saideira" vieram mais pesadas (e melhores) que de costume. O bloco das belas e complexas teve "Canção Noturna" e "Ainda Gosto Dela". O dos superhits, "Garota Nacional" e já citada "Uma Partida de Futebol". Mas os melhores momentos do show foram o Skank maduro, roqueiro em "Três Lados" e "Vou Deixar", lírico na tocante "Algo Parecido", épico no dueto surpresa com Milton Nascimento em "Resposta", no início do bis.

Mineiro e manso, foi um término singular para uma cena cultural habituada a implosões pirotécnicas, acessos de fúria e litígios em praça pública. Um fim bossa nova para uma banda de rock. Acabar um relacionamento, puxar o plugue do amplificador com o grupo já longe do auge, mas com agenda de shows sólida e "dinheiro pingando direitinho na conta", como definiu Samuel, é um ato de coragem. Sobre o que se passou na cabeça do quarteto nos últimos acordes de "Tão Seu", que fechou o show, só se pode especular. Pontos finais unem alívio e tristeza, esperança e arrependimento, nostalgia e sensação de liberdade.

A reboque, um Mineirão de dúvidas-clichê de separações. É agora mesmo? Por que não para sempre? E os bons momentos? Haveria mais? Daria para fazer diferente? Para recomeçar? A que preço? Bem mais que o tempo que nós perdemos ficou para trás também o que nos juntou. Às 22h35 de 26 de março de 2023, Samuel, Henrique, Haroldo e Lelo deixaram o palco diante da multidão que ainda espera resposta.

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